Deixa de exercitar, move-te | Aia Boldovskaia

Fazes exercício, mas passas o dia sentado? Lê isto

Imagina o seguinte: começas o dia com uma corrida matinal ou uma aula no ginásio. Sentas-te à secretária com a sensação de dever cumprido — fizeste exercício, estás a cuidar da tua saúde. Mas o dia avança e, sem dares por isso, passas as próximas 10 horas entre reuniões, trabalho ao computador e algum scroll no sofá à noite. Mexeste-te? Sim. Mas estiveste sedentário quase o resto do tempo.

Este cenário é mais comum do que parece. E revela um erro de perceção: atividade física e sedentarismo não são opostos diretos. Podes ser fisicamente ativo e, ainda assim, ter um estilo de vida sedentário. E isso tem consequências reais.

Quando o exercício não chega

Sedentarismo é o tempo acumulado em comportamentos de vigília em que estás sentado ou deitado, com gasto energético muito baixo (≤ 1.5 METs). Ver televisão, conduzir, trabalhar ao computador — tudo conta. Atividade física, por outro lado, é qualquer movimento que aumenta o teu gasto de energia acima do repouso.

Pensa nisto como duas linhas paralelas a correr ao longo do teu dia. Uma mede os minutos em que te mexes. A outra, os minutos em que ficas imóvel. E ambas contam para a tua saúde — mas de formas diferentes. São dois fatores de risco independentes. Fazer exercício não “anula” os efeitos do tempo sentado, e estar sentado não elimina os benefícios de uma caminhada. Mas o equilíbrio entre os dois é o que faz a diferença.

Durante anos, as recomendações focavam-se apenas na quantidade de atividade física: 150 minutos por semana de intensidade moderada a vigorosa. Hoje, isso já não chega. A evidência mais recente mostra que também é preciso reduzir o tempo total sentado e, acima de tudo, evitar longos períodos sem te levantares.

Porquê? Porque passar o dia sentado — mesmo que vás ao ginásio — está associado a um risco maior de morrer mais cedo e desenvolver várias doenças não transmissíveis. E não é só o total que importa. A forma como o tempo sentado se distribui ao longo do dia também faz diferença.

Quando passas horas seguidas sem te mexer, o teu corpo entra num modo de pausa metabólica. Mas pequenas interrupções — levantar-te, caminhar, espreguiçar-te — ajudam a reativar a circulação e a regular os níveis de açúcar e gordura no sangue. É por isso que cada vez mais estudos sugerem interromper o sedentarismo a cada 30 a 60 minutos, especialmente se não atinges os níveis recomendados de atividade física.

Pausas inteligentes

A boa notícia? Não precisas de mudar radicalmente a tua vida. Basta ajustá-la. Se trabalhas sentado, tenta levantar-te de hora a hora. Faz uma chamada em pé. Vai buscar água. Usa as escadas. Sai uma paragem antes. Organiza o dia com mais movimento leve (mesmo que não seja “exercício”).

Padrões mais “fragmentados” — com mais pausas e menos tempo seguido sentado — estão ligados a melhores indicadores de saúde. E cada minuto conta. Literalmente.
No fundo, não se trata de fazer mais ou menos exercício, mas de viver de forma menos parada.
A evidência atual aponta para efeitos negativos claros do sedentarismo prolongado, mas ainda há perguntas por responder. Por exemplo, ainda não existe consenso sobre qual o limite exato de tempo sentado por dia que representa um risco significativo — algumas investigações sugerem 8 horas, outras apontam para 10 ou até 12. Também não está totalmente claro até que ponto interromper o tempo sentado pode compensar o risco, especialmente em pessoas que são fisicamente ativas. A forma como diferentes padrões de sedentarismo afetam grupos diversos — por idade, género, ocupação ou estado de saúde — é outro tema que está longe de estar fechado.

O que sabemos, com segurança, é que reduzir o tempo sentado e incorporar mais movimento leve no dia a dia é uma decisão com muitos benefícios. Até sabermos mais, o princípio de precaução aplica-se: se podemos mover-nos mais, devemos fazê-lo. O corpo humano foi feito para o movimento, não para a imobilidade silenciosa dos ecrãs e cadeiras.

Desafio para hoje? Conta quantas horas passas sentado. E vê quantas vezes consegues interromper esse padrão. O teu corpo vai agradecer — agora e no futuro.
Fonte:
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Wu, J., Fu, Y., Chen, D., et al (2023). Sedentary behavior patterns and the risk of non-diagnosis of non-communicable diseases and all-cause mortality: A systematic review and meta-analysis. International Journal of Nursing Studies, 146:104563. https://doi.org/10.1016/j.ijnurstu.2023.104563
2025-03-25 10:00 Conceitos